Essência, um vazio dentro de mim.
- Patrick Psicologo
- 30 de mar.
- 3 min de leitura

Entendido como algo original de nossa personalidade, expressão de autenticidade, gostos pessoais por excentricidades e simplicidades, nossa essência é encontrada nos momentos de expressão irreverente acompanhada por alegria e bem-estar. Uma conversa com uma amiga(o) querida(o), uma música que emociona, um passeio ao pôr do sol, uma noite de diversão e bebidas, um livro que põe palavras em experiências pessoais. Podemos nos reconectar com nossa essência por meio de atividades prazerosas que se expressam de forma natural, sem a necessidade de um esforço ou comedimento de palavras, Eu sou assim, é o meu jeito, assim me divirto e sou feliz, essa é minha essência.
Não raro é, ouvir uma queixa alegando que gostaria de voltar a ser como antes, uma sensação que expressa a perda de algo valioso, não de um objeto mas de uma parte de si. Voltar a ser, como se em algum momento tivéssemos nos desconectado da essência e deixado ser, com isso passando a acreditar de forma verdadeira que algo no interior de nosso ser se perdeu e nutrimos a esperança de reencontrá-lo.
Entretanto, me pergunto, existe essência? Inspirado pelo livro Ter ou Ser?, de Erich Fromm, tendo a resposta que não existe uma essência e sim inclinações que quando realizadas nos convergem ao bem-estar e sensações de conexão e felicidade. Isso significa dizer que na realidade não perdemos algo e não há nada que nos falta. A sensação de sugerir um reencontro com quem imaginamos ter sido no passado, é um anseio por dar vazão a nossas inclinações ao que nos gera satisfação e que confundimos com estar completo e em pleno bem-estar.
Pensemos agora na diferença entre ter e ser, baseados nos pensamentos de Erich Fromm. Enquanto ter sugere o comportamento de adquirir e usufruir de objetos e pessoas, buscando com isso cessar a sensação de que algo falta, alimentando o ego para sentir-se completo. Ser, por outro lado, sugere o comportamento de diluir-se nas experiências, um esquecimento de si mesmo e abertura para conectar-se com o mundo e as pessoas.
Erich Fromm escreve que “a satisfação irrestrita de todos os desejos não conduz ao bem-estar, nem é o caminho para a felicidade ou mesmo para o prazer máximo” (p. 16, 1976), então, qual o caminho para o bem-estar? Vivemos em um momento em que propagandas são mostradas de modo personalizado com base no histórico de busca de cada usuário, produtos, sonhos, estilos de vida, experiências pessoais e sociais são oferecidos e junto com eles promessas de realização; ironicamente se acredita nelas e a compra é feita ou a vontade de realizá-la se instaura. Mais tarde percebe-se, que após o regozijo de ter o bem nas mãos, o sentimento de incompletude retorna e permanece, sinalizando que há um buraco vazio e essa sensação nos move a querer tapá-lo. Esse sentimento, é a consciência da experiência do desejo, somos seres essencialmente desejantes e a marca dessa condição é o sentimento de um vazio interior.
Estamos fadados à insatisfação e a única solução seria a resignação diante dessa condição? É um pensamento possível e válido, no entanto, infeliz. Mesmo diante de uma estrutura desejante e que produz o sentimento de incompletude, é possível encontrar um caminho para o bem-estar, esse começa com a conscientização do vazio e da falta, da aceitação da impossibilidade da completude e do reconhecimento dos próprios desejos. Aqui se torna importante fazer uma diferenciação, os próprios desejos são nossas inclinações pessoais, lazeres, produções e encontros que nos geram deleite diante da vida, ao contrário dos desejos que nos são vendidos por meios de comunicação e formam o que chamo de desejos artificiais, sem um vínculo afetivo profundo. Por fim, conectar-se aos próprios desejos e poder dar vazão às inclinações pessoais não garante o sentimento de completude nem o preenchimento do vazio, mas pode tornar a experiência de vida autêntica e leve e o sentimento de bem-estar diante do cotidiano pode estar presente com maior frequência.